terça-feira, 18 de dezembro de 2012

As horas


por Vera Barbosa



Deslizar dos ponteiros:
tic-tac – tic-tac – tic-tac.
De segundo em segundo,
foi-se um ano inteiro.

"Hoje o tempo voa, amor!
Escorre pelas mãos..."

Ao som de Tempos Modernos - Lulu Santos

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Catarse


por Vera Barbosa




Todo mundo se sente cansado um dia. 

Talvez consumido pela rotina, às vezes massacrado pelos problemas ou mesmo enjoado dos próprios hábitos, tantas manias inúteis, a falta de tolerância consigo mesmo e com os outros... Falta novidade, a inércia te consome, você quer novidade. E, embora o novo muitas vezes assuste, também te revigora, imprime uma certa energia ao seu corpo e à sua mente. E você fica motivado a descobertas, novos sonhos, desafios, começa a se transformar. É da vida, faz parte do ciclo, muito importante se renovar e renovar o que está ao seu redor. Rever seus conceitos, mudar de opinião e de comportamentos; mudar o cabelo, o jeito de vestir, a disposição dos móveis, talvez os próprios móveis. Eu tenho me sentido bem cansada de mim, sabe? Sinto-me sem atitude diante da vida. Talvez até tenha, mas não da forma correta, sei lá, já que não tenho bons resultados. Sei que ando entediante, reclamona, uma chata! E, mesmo sabendo que não tenho o controle dos fatos que, direta ou indiretamente, me atingem, tenho me perguntado sobre como mudar esse cenário e me tornar uma pessoa mais leve e agradável. Pode parecer nada ou muito pouco diante dos olhos da maioria, mas está me ajudando a rever o filme da minha vida, a avaliar erros e acertos, e a pensar sobre o que fazer com tudo isso. Admito que dá um puta medo, tristeza em alguns momentos, desânimo em outros, pois temo não conseguir e piorar ainda mais as coisas. Já cheguei a pensar que os ignorantes, os apáticos e os alienados são mais felizes, já que não se abalam com nada e se satisfazem com tão pouco. Mas acabo acreditando, de novo, em mim. Porque algo, lá no fundo, me diz que estou no caminho certo, pois olhar-se minuciosamente exige coragem; admitir suas fraquezas em público não é para qualquer um. Então, arregaço novamente as mangas e mãos à obra! "Nada permanece inalterado até o fim", tolo é aquele que sequer desconfia. Eu quero e preciso mudar. Você vem comigo?

***ao som do silêncio



quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Pulsar (Abraço de anos-luz)

por Vera Barbosa




quando saio dos seus braços
solto a fita, fica o laço


* Ao som de Pulsar - Caetano Veloso *

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Mania de você (Meu bem, você me dá água na boca)

por Vera Barbosa




Apaixonar-se é redescobrir sabores. Porque paixão, no seu auge, se assemelha a calda de chocolate quente derretendo em bola de sorvete de creme... E a gente quer mais é se lambuzar! Não é à toa que o amor engorda... Tem filminho com guaraná e pipoca sob o edredon, na sexta-feira, pizza com coca-cola no sábado à noite, bombons para se reconciliar com a pessoa amada... Também é sabor e alegria, no passeio no parque, no algodão doce e na maçã do amor num dia de domingo... Está na cerveja gelada, em dia de sol, com o casal e amigos, sugere um vinho tinto e fondue em noite de inverno, café da manhã (na cama) com a pessoa amada todos os dias... Quem ama adora inventar "coisinhas", quitutes para acariciar seu parceiro e termina tudo em sanduíche de gente! Isso porque cama e mesa têm uma relação muito estreita, pois o paladar está intimamente ligado ao prazer e revela muito de nosso apetite sexual. Nunca reparou? Comece a observar.

*** Ao som de Mania de você - Rita Lee ***

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Sorri (Vai mentindo a tua dor)

por Vera Barbosa



Quer saber? Acho uma babaquice essa coisa de ficar rindo à toa. Sim, porque não é permitido sentir, sofrer, chorar, pensar, refletir, contestar. Muito mais fácil fingir uma felicidade constante, demonstrar uma euforia aparente, sorrindo amarelo, mascarando as fragilidades, escondendo os problemas, negando as dúvidas, desviando-se das contradições. Afinal, o mundo moderno exige que você seja competente, bem-sucedido, independente e, principalmente, auto-suficiente. Você é feliz, não tem baixo astral, não precisa de ombro amigo, pra quê???!!! Só que ter bom humor não é isso! Fingir que os problemas não existem, que a vida é bela e cor de rosa o tempo todo, que todo mundo é feliz, que você não esperava mais de alguém... "Ah, mas tristeza não combina com você", lhe dirão! E, se notarem sua tristeza momentânea, muitos se afastarão. Sabe por quê? A maioria das pessoas não se deixa emocionar, não estranha nem se estranha porque não tem estrutura para enfrentar os problemas e resolvê-los, já que tem medo da solidão. "E se eu  ficar sozinho, se me abandonarem???" Para elas, é mais fácil fingir que tudo está bom do jeito que está, não importa se poderia ser melhor, é mais fácil não se comprometer com a vida. Aí, quando estão fora do seu alcance visual, elas desmoronam, choram sozinhas, desfalecem. E acabam num divã, sem encontrar resposta alguma, esperando que o outro lhes aponte a saída. E, no dia seguinte, estão novamente fingindo que a vida é um mar de rosas... É bom sorrir, é o melhor antídoto sim, contagia, mas sem ignorar seus altos e baixos, tirando lições das tristezas do cotidiano. Porque são elas que lhe fortalecem e impulsionam às soluções de tantos problemas, para que você possa sorrir com a transparência e a espontaneidade das crianças.

* Ouvindo Djavan, Sorri (Smile) *

sábado, 18 de agosto de 2012

Como se não houvesse amanhã

por Vera Barbosa


Ame sem medo de arriscar, sem economia de gestos, sem estratégias, sem vergonha de se declarar, sem temer o ridículo, sem mentir, sem manipular, sem competir, sem menosprezar, sem ofender, sem agredir, sem duvidar. Ame de peito aberto e sem medidas, pois amor é alimento fundamental. Como disse Caetano, certa vez, "todo mundo precisa ouvir o óbvio". Infelizmente, há quem não demonstre para não se deixar ver por dentro. O orgulho é mesmo uma droga!

* Ao som de Pais e filhos - Legião Urbana *

Segredos (Pra que ela não tenha medo quando começar a conhecer os meus)

por Vera Barbosa



Não se baseie em primeiras impressões para definir alguém. Ninguém se conhece à distância, é percepção equivocada. Somente a convivência retira os véus e permite penetrar as particularidades. E a gente aprende a se respeitar, e também as imperfeições alheias, na medida em que um extrai do outro o seu melhor.  É no dia a dia que as pessoas se deixam perceber. 

* Ao som de Frejat *

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Fertilidade

por Vera Barbosa



Comecei esse blog falando de canteiros, hoje falo do que os fazem brotar, do que dá origem às ideias que traduzo em palavras e compartilho com vocês. Escrevo a partir de meus questionamentos, minhas dúvidas, o que não conheço ou entendo, tudo o que não quer silenciar. Porque a curiosidade me instiga a descobrir o que não sei e a externar tudo aquilo que me causa espanto, admiração, perplexidade, tristeza, alegria, contemplação e até mesmo agonia; o que eu vivo e também o que deixo de viver, por falta de oportunidade ou simples questão de escolhas. Quando reflito, fico fértil, minha criatividade é quadruplicada! Por isso, transbordo e publico o que sinto, penso, observo e reflito.

*Ouvindo Canteiros - Fagner *

Maravida (Mar, amar, amor)

por Vera Barbosa



Só quem saboreia a vida sabe que gosto têm as diversas sensações causadas pelos sentimentos que experimentamos. Viver inclui experienciar, correr riscos. Portanto, inevitáveis são os dissabores, já que nem tudo são flores e o ser humano é mestre em decepcionar e ferir. Mas a gente sobrevive e supera, "deixando-se cortar e voltando sempre inteira", como disse sabiamente a poeta.

"Sempre menina franzina, traquina
De tudo, querendo provar
Sempre garota, marota, tão louca
À boca de tudo querendo levar"
(Gonzaguinha)

Cheiro de amor (Que fragrâncias estão guardadas em você?)

por Vera Barbosa

Plumeria (Jasmim-Manga)

"Os aromas trazem lembranças, nos confortam, despertam nossos sentidos."

Quer coisa mais gostosa, aconchegante e intimista que acordar com cheiro de café pela casa? Ah! Aroma é tudo pra mim, que sou hiper-super-ultra-mega-olfativa! Meu cérebro (e também meu coração) resgata pessoas e momentos inesquecíveis pelo odor daquele instante; lembro mais de cheiros que de imagens. Cheiro do perfume da pessoa amada, de manga, goiaba e abacaxi na fruteira, do feijão e das compotas que minha mãe faz, cheiro de mato e terra molhada depois da chuva, perfume dos cabelos de um certo alguém, da casa da minha avó paterna, de dama da noite no jardim de casa na minha infância, daquela rosa cujas pétalas guardei entre as páginas da agenda, cheiro de banho, de roupinhas de bebê, do perfume que meu irmão caçula usava, cigarro de palha e rapé do meu avô materno, cheiro de livro novo, dos lápis de cor do primário... Sensações de afeto, de prazer, aromas de alegria e saudade, cheiros de amor... A mágica da memória olfativa, em mim, é surpreendente. E música é perfume!

* Ao som de Cheiro de amor - Maria Bethânia *

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Equilíbrio

por Vera Barbosa




Conheça-se. Valorize-se. Respeite-se. Amor próprio é fundamental! Mas tente se corrigir em suas deficiências. Seja autêntico, mas procure melhorar. Entretanto, não permita que tentem te moldar. Absorva de cada um o que for pra acrescentar. Seja sempre você, mas não tenha medo de mudar. Quando nos conhecemos a fundo e queremos ser alguém melhor, temos humildade para reconhecer e admitir erros e alterar comportamentos. Portanto, tenha personalidade e saiba respeitar a alheia. São as diferenças que nos fazem aprimorar. Lembre-se de que ninguém é perfeito, nem você, pois "de perto, ninguém é normal." Não se esqueça de que todo mundo tem algo de bom, inclusive você, já que "cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é." E quem muito aponta feridas alheias acaba por não ver as próprias irregularidades. Viver é troca, ninguém se faz sozinho. Quem não está disposto a aprender acaba desperdiçando a oportunidade de evoluir e conhecer pessoas incríveis! Dê o seu melhor aos que estão à sua volta e esteja aberto para receber sua melhor porção. Como todo exercício, é difícil e requer prática contínua, mas faz um bem danado, pois proporciona equilíbrio. Experimente!

*Ao som de Vaca profana / Dom de iludir - Caetano Veloso*

Emoção-razão (Onde é que isso vai dar?)

por Vera Barbosa




De tanto querer
De tanto sentir
De tanto cantar


De tanto sofrer
De tanto sorrir
De tanto pensar


De tanto morrer
De tanto viver
De tanto se dar


De tanto sorver
De tanto dizer
De tanto calar


Sem nada fazer
Sem nada pedir
Sem nada tentar


Por tanto temer
Pôr tudo a perder
Por medo de amar


E o mar... 
Ah! O mar...



*Ao som de coração-pensamento - Caetano Veloso*

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Insônia (Sonhando acordada / Dormi com você)

por Vera Barbosa



        Invado teu sono em segredo.
Noite adentro, percorro tua cama.
Sinto teu cheiro, o corpo sedento...
Outrora, estiveste comigo; agora,
Não mais, mera lembrança...
Intocável, te amo à distância;
Acordada, sonho contigo.

*Ao som de Ângela RoRo*


domingo, 22 de julho de 2012

Catavento e Girassol

por Vera Barbosa



Eu e você
Nem melhor nem pior
Apenas diferentes

No jeito de sentir
Na forma de se dar
Na maneira de absorver
No modo de se entregar

Nem melhor nem pior
Apenas diferentes

Antônímias
Contrapontos
Figuras não-congruentes

Você e Eu
Nem melhor nem pior
Apenas diferentes


- Você sou eu que me vou no sumidouro do espelho -


sábado, 21 de julho de 2012

Imensidão (Se eu sou algo incompreensível...)

por Vera Barbosa



O que é melhor ou pior:
sentir-se nada no meio de tudo ou
sentir-se tudo no meio do nada?

Sou uma gota no oceano ou nele 
transbordam de mim os mistérios?

Quero ser desvendado em cada parte
infinitesimamente oculta ou 
desejo recolher-me em meus segredos?

- hora, silencioso e calmo..
- noutra, voraz e devastador!

Serei eu o próprio mar?



Ao som de Esotérico
Gal Costa e Maria Bethânia

quinta-feira, 19 de julho de 2012

Espera (Onde estará o meu amor?)

por Vera Barbosa



Nunca mais é muito tempo. Para sempre também. Contudo, no pacto, tem-se a esperança do fim ou da eternidade. Infinitamente maior e lenta é a dor da ausência não-consentida. Na renúncia, a espera é vazia e o silêncio fala alto. O sentimento não cala, o tempo se arrasta e cada segundo se faz uma vida inteira.

(Embalada por Onde estará o meu amor - Chico César)

sexta-feira, 13 de julho de 2012

O Quereres

por Vera Barbosa



Minha intensidade lhe incomoda porque tem a medida exata da sua indiferença. O inverso das reações são razões diretamente proporcionais. A questão é que sou transparente e não demonstro apatia ao que me intriga nem ao que me incomoda; penso demais, gosto de profundidade, questiono; não sou do oba-oba, não conduzo minhas relações com desinteresse; e considero a superficialidade o grande mal das relações modernas.

Eu te quero (e não queres) como sou
Não te quero (e não queres) como és

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Eu por mim (Linha tênue)

por Vera Barbosa


ao som de Maria Gadú

Sou dengosa, até dramática, lírica, e exagerada na mesma proporção, fiel, apaixonada, invocada, mas alegre, intensa, muitas vezes tensa, mas leve como uma bolha de sabão, cúmplice, mas crítica, exigente, mas sei ser condescendente, implicante, mas carinhosa, nostágica, também trágica, melancólica, mas feliz, interessada, mas não menos interessante, carente, mas muito amada, impulsiva, compulsiva, mas tento me equilibrar, transparente, dizem que sou inteligente, errante, sou vermelha, sou quente, mas também sou divertida, ousada, atrevida, detesto despedida, sou chata muitas vezes, noutras indecente, louca, inocente?, chorona, mas também um tanto má, perversa se preciso, ingênua, mas não burra, criativa, e até por isso impaciente, provocante, chego a ser mesmo irritante, mas sei pedir desculpa, coerente, tenho argumentação, sou influente, justa, sigo meu coração, ciumenta, dedicada, vivo na contramão, sou mutante, mas não inconstante, controversa, mas sou ética, densa, dizem que não compensa, mas é assim que eu sou.


"Ou você me odeia descaradamente, 
ou disfarçadamente me tem amor."

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Contemplação (Quando você chegou...)

por Vera Barbosa


"A sua alma me abraçou
O seu calor fez o sol se pôr
A lua cheia se esvaziou
Quando você chegou"


Não quero subterfúgios, qualquer truque contra a emoção, não pretendo driblar minha essência. No máximo, me permiti distraí-la até você chegar. Agora tenho pressa, tenho sede e fome de contemplação. Quero ir além, muito aquém do suposto 'envolvimento', que não traz plenitude e encantamento. 

Quero, mereço e preciso que algo maior me arrebate, eu sou mesmo assim. Não quero grilos, bate-boca, provocações, respiro poesia e canção. Anseio chuva na praia, aroma de café pela casa, bolinhas de sabão... Mangas na fruteira, pôr-de-sol, ipês, arco-íris. Vinho tinto, filme com pipoca, paisagem bucólica, sorvete de creme com calda de chocolate, me lambuzar de prazer, em seus braços adormecer... Seduzir-me como a serpente a Eva, desativar meu controle sobre mim mesma, esse o seu papel desde o remoto princípio. 

Viver é intenso e contínuo, requer entrega e cautela; relacionar-se, intempestivamente, causa tropeços: há que se ter delicadeza. Meu amor só se concretiza na paz. E com você. Vem...

domingo, 27 de maio de 2012

Saudade (La noche nuestra, o mundo a rodar)

por Vera Barbosa




"saudade dela:
escuro no quarto,
lua na janela"

(ao som de Besame - Jane Duboc)

sexta-feira, 25 de maio de 2012

Naquela estação (Você entrou no trem)

por Vera Barbosa


Gosto de ler no ônibus e no metrô. Para me informar, me distrair, passar o tempo, chegar mais rapidamente ao meu destino. É uma forma de tornar a viagem menos difícil e encurtar a distância. Nem sempre é possível, dadas as lotações dos carros e o volume cada vez maior de usuários. Quase sempre, vou em pé, mas dou um jeito de abrir meu livro ou revista sob os olhares dos que estão, mais confortavelmente, acomodados em suas poltronas. Sou baixinha e, não raramente, leio encolhida entre os ombros de um e outro cidadão, o que exige malabarismos para me segurar e ainda conseguir virar a página. Mas até esse desafio torna o hábito mais prazeroso! 

Adoro quando o texto é engraçado, divertido e me pego rindo sozinha diante dos olhares aflitos dos passageiros à minha volta. Mas também me emociono, e é curioso vê-los com uma interrogação enorme na testa, loucos para perguntar por que estou chorando. 

Hoje, no metrô, ao voltar sentada e ler Rubem Alves, me emocionei com um trecho em que ele relembra, ternamente, alguns momentos de infância e a saudade do pai. Por segundos, esqueci onde estava e me deixei levar pela delicadeza das palavras. As lágrimas escorreram, nem me dei conta, e fui surpreendida com a senhorinha ao meu lado, que, esticando a mão, tocou meu braço e ofereceu um lencinho de papel murmurando "não chore, minha filha, vai dar tudo certo", no que respondi sem pensar "é, no final, sempre dá certo". 

Guardei o livro na mochila, me despedi desejando-lhe um bom dia e desembarquei sorrindo naquela estação.

(Ao som de "Naquela estação" - Adriana Calcanhotto) 

terça-feira, 22 de maio de 2012

Sobre o exercício de amar (Revelar todo o sentido)

por Vera Barbosa



Quem nunca quis viver um amor de novela ou cinema, daqueles que nunca morrem e cujos protagonistas se perdem nos anos e, um dia, se reencontram e descobrem que nunca deixaram de se amar? Amores impossíveis, que enfrentam tudo e todos para acontecer. Amores de romances, que sangram e voltam a brilhar como se nunca tivessem se apagado. 

Amores juvenis, daqueles que fazem você rir de si mesmo e tudo a sua volta, como se nada fosse mais importante que vocês. Sabe amor de juventude? Que pega garupa na bicicleta, toma banho de cachoeira,  sorvete na praça, cinema, parque de diversão... Ou um amor maroto, com molejo e pimenta, mas recheado de poesia, vinho e ternura. 

Na vida, a gente experimenta um pouco de tudo isso, mas nunca tudo ao mesmo tempo, claro. 

Já vivi o suficiente para amar, sorrir, chorar, sangrar e renascer, e sei que nada se repete. Tudo é novo de novo. Porque somos, inclusive, resultado do que o outro desperta em nós e do que despertamos nele. A troca é simultânea. Ninguém é, genuinamente, puro a ponto de não ser estimulado e, tantas vezes, influenciado por sensações e olhares diferentes. 

Nenhuma presonalidade permanece intacta depois da convivência. E o mais interessante é que a gente se recicla a cada começo-meio-e-fim, mas continua sendo a gente mesmo. A alma se renova, tudo se transforma, mas a essência permanece. Revestida, talvez, de detalhes absorvidos na passagem das horas a dois, com o que ficou do encantamento, dos momentos mais íntimos, das descobertas e anseios, das perdas e ganhos. 

É o mistério de recomeçar. Deve ser essa a grande lição de amar e desamar: se descontruir, reconstruir e voltar mais madura, inteira, acreditando ser possível. De novo.

"Nem que eu bebesse o mar, encheria o que eu tenho de fundo."

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Austero, porém doce (Eu sou assim)

por Vera Barbosa



O telefone não para de tocar desde as oito da manhã! Meu pai, Oliveiros Barbosa, completa 83 anos de vida, saúde e muito trabalho. Já está meio cansado de atender às ligações, mas eu insisto, pois a data é motivo de muita alegria para as cerca de 140 pessoas da família e tantos amigos. Hoje, escrevo para homenageá-lo, exaltar sua persistência ao longo dessa trajetória e destacar que, por toda a vida, ele não se dedicou apenas a sua família, mas a todos a sua volta.

Por todo o amor que me dedicou - e ainda dedica-, por sua infinita bondade e sabedoria, por ser um homem honesto e justo, papai é meu bem mais valioso, meu espelho. Nascido em Brotas, interior de São Paulo, começou a trabalhar aos 12 anos de idade. Conheceu minha mãe, em São Roque, aos 19 anos. Ela estava comprometida, mas não resistiu ao encanto dos olhos azuis do meu velho. Ela conta que ele era super charmoso e elegante, o que a fisgou definitivamente. Casaram-se em 1952, uma união de amor que fará 60 anos em 20 de setembro próximo. Filho único, meu pai recebeu a família da noiva como sua, sendo muito presente na vida de todos. Até hoje, meus tios o beijam e pedem a bênção e meus primos (muitos já são pais e têm mais de 40) sentam ao seu redor para ouvir suas histórias, cenas que sempre me emocionam.

Trabalhador, de um duro danado para criar os dez filhos. É exemplo para todos que têm o privilégio de conhecê-lo e conviver com ele, por seu caráter e dignidade, já que nunca abriu mão de seus valores para "se dar bem". Jamais passou por cima de alguém, jamais humilhou. Educou-nos com o princípio de que nada vale a perda do sono tranquilo e de se estar em paz com a própria consciência. Altruísta, sempre ajudou os menos favorecidos, fazendo pelos amigos o que faria por seus filhos. É um homem totalmente desprendido de coisas materiais, que nunca desejou nada além de saúde e trabalho, para educar seus filhos, pagar suas contas em dia e ter um lar harmonioso. Generoso, nunca pensou em acumular, mas em dividir.

De família humilde, não teve oportunidade de estudar e sempre trabalhou muito, viajando e montando pedreiras por esse Brasil de meu Deus, sem direito a folgas sequer aos domingos e feriados. Mas é um sábio por natureza, foi a vida que lhe deu todo o conhecimento necessário. Foi nas idas e vindas, com muitas curvas sinuosas, que ele pôde observar, assimilar, aprender. O rádio de pilha, o melhor companheiro, foi parceiro constante. Até hoje, tem o hábito (que eu herdei) de dormir ouvindo AM. Vivenciou momentos marcantes da história, é um contador de "causos" excepcional, pela riqueza de detalhes que reproduz com fidelidade. Tem um lirismo que lhe é peculiar e que cativa o interlocutor. Bem informado, não perde um telejornal e discute qualquer assunto. Fez questão de votar no Lula nas duas últimas eleições de que participou; mesmo lhe facultando o direito de votar, nunca abriu mão de exercer sua cidadania. É patriota, apaixonado por sua terra e sua gente e, apesar dos pesares que a gente conhece, tem orgulho de ser brasileiro.

Adora terra, verde e pescaria, mesa farta - não aprecia os sovinas.

Tem um ar meio bravo, às vezes truncado, sisudão (coisa de taurino, eu acho, de quem pensa muito, está sempre refletindo), mas tem um coração mole que só. Vira e mexe, descasca frutinhas e me traz carinhosamente. Pera, maçã, laranja, manga...Adora limonada, boxe e futebol. Narra jogos de Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe como se os tivesse visto em campo ontem e pela primeira vez. E vibra!!!

É ciumento, nem parece que conhece minha mãe há 64 anos: é um eterno apaixonado!

Hoje, somos oito filhos (dois, infelizmente, faleceram), dez netos e dois bisnetos. Temos a alegria de ser uma família unida, cujos filhos, genros, noras, irmãos, cunhados, sobrinhos, tios, netos e primos se veem e se ajudam constantemente. Somos, todos, muito ligados. As reuniões em nossa casa (aniversários, Dia das Mães, Dia dos pais, Natal...) reúnem cerca de 50, 60 membros da família durante todo o ano. Somos festivos e cantamos ao som do violão de minha mãe, meu irmão, meu primo e um dos meus tios, além do bandolim da tia mais velha. E papai chora ao ouvir Lupicínio, Noel, Cartola, Nelson (Cavaquinho e Gonçalves), Dorival, Orlando, Ary, Silvio Caldas, Paulinho... toda a semelhança não é mera coincidência, a genética não mente!

Nossa casa, na zona norte de São Paulo, tem um grande quintal e, como ele, está sempre de portas abertas para todos. Quem chega pode tomar um café torrado em nosso fogão de lenha e comer um feijãozinho à moda mineira que só minha mãe sabe preparar. Ele resmunga um pouco, algumas vezes, pois não tem mais paciência para muita agitação, coisas da idade... mas acaba se rendendo e se emocionando ao dizer que "a casa do bode veio é a mais querida". Ele é assim.

Parabéns, Pai! É uma honra ser sua filha!

segunda-feira, 30 de abril de 2012

Discordar é saudável (Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante)

por Vera Barbosa



"Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo"

Observe as pessoas e os fatos cotidianos, reflita sobre suas - delas e de você mesmo(a) - ideias e ações, e você constatará que pensamentos e atitudes opostos levam à reflexão e à construção de um novo olhar, necessário e surpreendente. Quantas vezes você não se viu mudando de opinião em assuntos que julgava encerrados, definitivos? E, de repente, chega alguém que se opõe ou acrescenta um dado, uma informação ou opinião que modifica totalmente a sua forma de pensar ou agir! E você pensa: "poxa, como eu não pensei nisso antes?!" ou então "nossa, eu não tinha visto por esse ângulo!". A explição é simples: discordar é mola que impulsiona a descobrir e aprender o que não se sabe, além de possibilitar releituras incríveis sobre si mesmo. 

Discordar é ter atitude, pois implica autenticidade. Quem te ama, muitas vezes, discordará de você. Porque quem ama torce pelo seu aprimoramento pessoal. Quem consente com tudo o que você pensa e faz, certamente, não contribuirá para o seu desenvolvimento. Discordar é buscar entendimento analisando outros pontos de vista, diversos dos seus. É aprendizado, um gesto nobre de coragem. 

Quem se isenta dessa responsabilidade é porque acredita que concordar sempre com o outro é prova de amor. Há quem o faça ingenuamente, por pura ignorância, com a ilusão de que não está causando problemas para o outro. Muitos, por comodismo, pois discordar dá trabalho. Afinal, não é fácil defender uma ideia ou uma opinião, até mesmo um projeto, de forma coerente, convincente e cordial, sem atritos, sendo desafiado a superar o que o outro defende. E, por fim, a pior classe dentre todos: a dos que não discordam por necessidade de se sentirem amados. Para os que se omitem, discordar significaria perder o afeto ou atenção do ser amado (quando esse não está preparado para receber opinião contrária), rejeição com a qual poucos aprenderam a lidar. 

Todos esses cometem erros graves, pois, na verdade, não se trata de um braço de ferro, para medir forças e apenas um sair vitorioso. Quando a discordância é saudável, todos ganham. Certo é saber discordar, fazê-lo com respeito ao que o outro pensa, sente e faz - mas discordando. Respeito esse que você demonstra ao se opor, ao contestar de forma honesta e bem-intencionada. Essa a principal função de quem educa, pais, familiares, professores. Porque educar, de certa forma, é colocar limites;  e limites são fundamentais para que os direitos e deveres individuais comecem onde terminam os do outro, e vice-versa.  E isso só é possível quando se estabelece um diálogo aberto e franco, no qual é possível discordar sem criar discórdia, desprezo ou vaidade; quando não se humilha nem se é humilhado, apenas se diverge em opinião.

Infelizmente, nem todos estão preparados para esse exercício, creio que a maioria não esteja. Contudo, cada um que o praticar contribuirá para modificar o quadro. Esse processo de constução e reconstrução da personalidade é indispensável e requer, inclusive, humildade para admitir quando o discurso do outro é vitorioso. Portanto, é importante que cada um faça a sua parte, sendo verdadeiro ao expor e contrapor ideias e ao ser desafiado em suas crenças e verdades. Transformar (para melhor) a realidade e se transformar, essa a utilidade do ato de discordar.

terça-feira, 10 de abril de 2012

O engolidor de sapos (Nada vem de graça, nem o pão nem a cachaça)

por Vera Barbosa



Ele buscava uma ideia brilhante. Afinal, estava desempregado há alguns meses e acreditava que, inovando, seria diferenciado para o mercado. Não tinha respostas dos currículos que enviava, ia a agências toda segunda-feira, mas, por seu esteriótipo, não era selecionado. Homem sem oportunidades, não tinha qualificação e sequer conseguia uma oportunidade temporária. O dinheiro estava acabando, as contas continuariam... Então, pôs-se a pensar em algo original e criativo, que o destacasse dos demais e lhe garantisse uma recolocação profissional.

Amante do circo, viu nele a sua fonte de inspiração. Afinal, com todo respeito à classe, fora feito de palhaço quase a vida toda, e talvez encontrasse uma saída por ali. Analisou, uma a uma, as profissões existentes e decidiu juntar algumas delas, adaptando-as a sua realidade, algo com que sempre se  identificara. Imaginou o que poderia ser mais curioso e interessante para a plateia, algo que a envolvesse e a fizesse desembolsar bons trocados por uma sessão. Foi quando a luzinha mágica do seu cérebro se acendeu e ele descobriu que tinha grande potencial para algo que todos desprezavam. Engolir sapos. Negro, pobre e homossexual, engoliu todos os sapos em todos os lugares por que passou. Fora desrespeitado em sua essência, estava "acostumado" a ser tratado assim por onde passasse.

É isso: seria um engolidor de sapos profissional. Genial! Imagina quanta gente o contrataria para engolir sapos por aí. A esposa cansada dos chapéus do marido, a secretária que não aguenta mais os desaforos do patrão, os pedestres sem segurança, motoristas e a indústria das multas, donas de casa sendo desrespeitadas em sua responsabilidade e importância, as mães e seus filhos malcriados, os baixos salários dos professores... Sem falar nos políticos, que ninguém mais aguenta digerir. Pronto, estava decidido: engolir sapos seria rentável e não o deixaria mais desempregado. Solucionaria os seus problemas e os dos outros.

Começou por estipular uma tabela de preços, que variaria de acordo com o tamanho do sapo. Começou a quantificar a dor de cabeça, o enjoo, as horas de digestão, despesas com sal de fruta e similares, uma boa cachaça para ajudar a descer. Tudo na ponta do lápis, fixou os valores para sapos pequenos, médios e grandes. Com o tempo e o sucesso da operação, poderia aumentar os preços e, caso a demanda fosse muito maior que o esperado, contratar alguns ajudantes, a quem ensinaria o árduo ofício.

A segunda etapa era a divulgação. Pensou em investir a última parcela do seguro desemprego em uma agência de publicidade, mas publicitários já nos enfiam goela abaixo mil sapos por dia, pensou,  e não seria justo ainda pagar por isso. Então, resolveu que faria a propaganda boca a boca. Nada mais justo. Afinal, ela, a boca seria seu instrumento de trabalho. Assim, à medida que engolisse um sapo para alguém, surgiriam automaticamente tantos outros a engolir.

Pôs-se a elaborar o cartaz a ser pregado na porta de casa, a humilde casa pela qual pagava o absurdo aluguel de R$ 600,00 e, para ele, sapo maior não há! Aluguel é dinheiro jogado fora, um sapo que atravessa a garganta e borbulha no estômago, fermentando todo o ser. Pois bem, o cartaz. Fez várias tentativas inúteis, nada lhe agradava. Achava tudo muito comum, nada original.

"Sapos, sapinhos, sapões. Engulo todos pra você."
"Se você tem nojo de engolir sapos, seus problemas acabaram!"
"Já parou pra pensar em quantos sapos você engole na vida? Deixa eu engolir por você."
"Traga o sapo, que eu engulo no seu lugar."

E assim foi, horas a fio, até descobrir a fórmula ideal:  "Venha descobrir como se engole um sapo de verdade!" Formaram-se filas gigantescas na sua porta, todos curiosos por saber quem era o novo mágico do bairro e como ele conseguiria engolir tantos sapos de uma só vez. Ninguém botava fé, mas eram mais curiosos que descrentes. 

A surpresa com o seu desempenho alarmou a população! O homem trabalhava 12 a 15 horas por dia, quase incessantemente, para dar conta da sapolândia do bairro. E o comércio cresceu. Veio gente de toda a redondeza. Começou a ganhar muito dinheiro e contratou uma recepcionista, um contador e um tesoureiro de sapos. Ampliado o quadro de sapistas, alugou um lugar melhor, maior, bem instalado e passou a atender também à classe média. Claro, aumentou os preços. Começou a lucrar como nunca pensara e criou franquias nos bairros nobres. Quem disse que rico não engole sapo? Engole, inclusive, para manter-se rico. Recebeu proposta de sociedade de gente influente, mas não queria dividir lucros. Agora, ele também era poderoso e faria com que outros engolissem os sapos em seu lugar. Treinou novos engolidores, lhes pagava um salário medíocre, o suficiente para não estar desempregado e comer. Comer sapos. Quem precisa aceita.

Alguns anos se passaram.

Enriqueceu.

Cansado, decidiu se aposentar.

Agora, tinha dinheiro, imóveis, carros importados, tudo o que podia comprar. Mas a triste constatação abalaria seu mundo. Foi aí que se deu conta de que não tinha saúde para gozar tudo o que conseguira acumular. Os anos engolindo sapos o comeram por dentro. Era tanta aflição, tanta mágoa, angústia, desgosto, infelicidade, que se tornou um morto-vivo.

Era opaco, deteriorado, quase podre. E foi então que percebeu que lugar de sapo é no brejo. Se tivesse reagido e vomitado cada sapo engolido, seria mais feliz. Talvez não tivesse emprego, dinheiro, mas teria dignidade. Devia ter-se rebelado! Ter gritado pro mundo as sua dores!

Angustiado e infeliz, decidiu abdicar. Vendeu tudo o que tinha. Doou as franquias a seus funcionários. Levou consigo uma muda de roupa, os pés descalços... Ia em busca de purificação. E foi morar na beira do rio, para tentar despejar todos os sapos que engoliu por lá.  Até secar.

quarta-feira, 28 de março de 2012

Recomeçar (Sabendo que só o tempo ensina a gente a viver)

por Vera Barbosa



Já não faço planos para o futuro. 
Criava expectativas demais, e a decepção me consumia. 
Com ela, vinham frustrações e mágoas. 
Aprendi a viver sem esperar nem procurar, mas com a certeza de que nada é por acaso. 
Assim, deixo que a vida se encarregue de mim. 
Tento ter paz, ser generosa e aprimorar meu espírito. 
Sou cheia de defeitos! Cometo erros, tropeço, fracasso. E recomeço. 
Creio que seja essa a grande lição: aprender a recomecar.

sexta-feira, 23 de março de 2012

Samba da bênção - Chico Anysio do Brasil

por Vera Barbosa 

Chico Alves...
Chico Mendes...
Chico Sciense...
Chico Xavier...
Chico Anysio.


Fim de espetáculo. 

Mais um querido Chico se vai e, com ele, boa parte da alegria dos brasileiros, sobretudo dos menos favorecidos e simples, a quem ele alcançava sem precisar de esforço e de cujas mazelas falava com sabedoria. 

Apesar de todo o conhecimento que possuía e do sucesso que alcançou, sobretudo na televisão, Chico soube atingir todos os públicos, sem distinção de classe. 

As centenas de facetas desse genial caricaturista fazem parte da história do humor brasileiro e da vida cotidiana. Sua crítica contundente questionou e influenciou comportamentos e atitudes - e a falta delas. 

Creio que seja sina dos Chicos essa capacidade de exteriorizar os sentimentos da gente de maneira tão especial e de, alguma forma, amenizar o sofrimento das pessoas, seja com música, humor ou oração.  Bem, o bom samba é uma forma de oração, disse o poeta. A piada e a alegria também.

Chico Anysio atravessou gerações e marcou todas elas com inteligência e inquestionável competência. Dever cumprido, Chico, pode partir em paz. 

Abram-se as cortinas do céu!